Qualquer pessoa que se considerar prejudicada por ato de terceiros tem o direito de comunicar à polícia o acontecimento de determinado fato, que, à primeira vista, lhe pareça delituoso, para que ela possa providenciar as buscas e investigações necessárias à apuração do suposto delito. Nesse sentido, a empresa que suspeitar da ocorrência de um delito em suas dependências, deve promover a competente representação policial para averiguação do fato, além das medidas judiciais com intuito punitivo, no exercício regular de um direito que a lei lhe confere. Porém, se a empresa ultrapassa os limites da legalidade e da razoabilidade, o ato, que em um primeiro momento se apresentava como lícito, torna-se ilícito, pelo excesso, representando abuso de direito, o que gera o dever de indenizar pelos danos causados. Foi exatamente o que aconteceu no caso analisado pela juíza Adriana Goulart de Sena Orsini, titular da 35ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte. Entendendo que a conduta de uma empresa foi abusiva, a magistrada a condenou ao pagamento de uma indenização por danos morais, pelo fato de ela ter tornado públicas as medidas adotadas contra o ex-empregado, de forma a atingir a sua conduta profissional.
O ex-empregado relatou que foi acusado de se apropriar de documentos sigilosos e de dados invioláveis da empresa. De acordo com a versão patronal, o reclamante teve acesso a essas informações privilegiadas na época em que atuou como advogado da empresa, passando, depois, a utilizá-las em sua atuação profissional nas causas trabalhistas contra sua ex-empregadora. Pelo que foi apurado no processo, a empresa fez questão de tornar públicas as acusações contra o advogado, registrando-as em defesas processuais inclusive colocadas a termo em ata de audiência. No entanto, na visão da julgadora, essas acusações são infundadas e não passaram de mero artifício para intimidar o advogado, já que ele estava defendendo trabalhadores em ações trabalhistas ajuizadas contra a empresa. Ao examinar as provas, a magistrada concluiu que a ex-empregadora não conseguiu comprovar sua alegação de que o advogado teria subtraído documentos exclusivos da empresa. Nesse sentido, a testemunha indicada pela própria empresa confirmou que o documento que embasou a representação penal proposta pela ex-empregadora contra o advogado foi dirigido aos fornecedores da reclamada, além de ter sido destinado também ao próprio reclamante.
No mais, como bem observou a magistrada, os dados constantes do referido documento não são de caráter sigiloso, porque são resultantes da reorganização entre empresas do mesmo grupo econômico, entre elas a reclamada, repercutindo até em notas fiscais por ela expedidas. A modificação do conteúdo das peças iniciais a partir da atuação do advogado nas causas contra a reclamada, ao modo de ver da julgadora, não demonstra revelação de dados sigilosos da empresa, como também não sustenta a suposta utilização de documentos restritos à ex-empregadora como prova das alegações, sequer apontados no processo.
Nesse contexto, a juíza sentenciante concluiu que a conduta adotada pela reclamada em relação à pessoa do advogado foi excessiva, em evidente ofensa ao seu nome, à sua honra, dignidade e imagem, especialmente perante seus clientes e o Judiciário. Para a magistrada, é nítido o intuito da ex-empregadora de inibir a atuação do advogado, além de colocar em xeque, publicamente, sua conduta profissional. Por essa razão, ela condenou a empresa ao pagamento de uma indenização por danos morais, fixada em R$50.000,00.