Tributaristas e tradings indicam que a repercussão da decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o PIS e Cofins na importação pode ter impacto nas contas públicas menor do que a perda de R$ 34 bilhões que o governo federal estimou.
Alfredo de Goye, presidente da Sertrading, uma das 20 maiores importadoras do país, diz que a decisão do Supremo é altamente positiva. Com a tributação menor, o valor da importação deve ser reduzido em cerca de 2%. É, porém, diz, um ganho de fluxo de caixa. Segundo ele, provavelmente a empresa já conseguiu se creditar da parcela de PIS e Cofins que agora o STF julgou inconstitucional, e, por isso, uma eventual ação judicial para recuperar o passado não seja interessante para a empresa.
Da mesma forma que numa operação interna, o PIS e Cofins pagos na importação servem, para as empresas que usam o cálculo não cumulativo, como crédito para abater do valor devido das duas contribuições nas etapas seguintes de comercialização ou produção. "Estamos pedindo orientação para um advogado sobre o que fazer nas próximas operações de importação, para avaliar se é possível recolher os dois tributos com base menor antes da publicação da decisão do STF."
Outro problema, diz Goye, é o efeito modulatório que o governo federal pode pedir. Isso faria com que a decisão só tivesse efeito daqui para frente, permitindo a recuperação do que foi pago a mais no passado somente para ações ajuizadas até dia 20 deste mês, dia do julgamento.
Segundo o secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Nelson Barbosa, o governo vai pedir ao Supremo que a decisão seja aplicada "preferencialmente só para frente". De acordo com ele, o governo estuda medidas para compensar eventuais impactos sobre a arrecadação. O ministro da Fazenda, Guido Mantega, explicou que o impacto da decisão do Supremo poderá não ser significativo sobre as contas do governo. "Se o STF definir que vale daqui para frente, não tem perda", afirmou o ministro.
Em nota, a Petrobras, a maior importadora brasileira, informou que ainda não é possível avaliar os impactos da decisão do STF, pois é necessário aguardar a publicação, inclusive quanto à modulação. A companhia não tem ação judicial específica sobre o assunto.
"Num ambiente de grande concorrência, o ganho no fluxo de caixa é importante", diz Júlio de Oliveira, sócio do Machado Associados. Ele diz, porém, que a tendência das grandes empresas é ter aproveitado o PIS e Cofins recolhidos na importação como crédito. A disputa pelo passado valeria a pena somente para quem não conseguiu utilizar os créditos. Ou seja, para empresas com débitos insuficientes ou que estejam no cálculo cumulativo das duas contribuições, por exemplo. "Creio que o impacto estimado de R$ 34 bilhões parece exagerado." Oliveira acredita que o governo federal esteja usando uma estratégia para convencer o Supremo a modular a decisão.
Um outro advogado, que preferiu não se identificar, também acredita que o valor de R$ 34 bilhões estaria inflado. Para ele, não há motivo para que haja uma corrida ao Judiciário agora. Isso porque, se o Supremo modular os efeitos, só valeriam as ações que foram ajuizadas até quarta-feira passada, quando se realizou o julgamento.
Se os ministros, porém, não optarem por modular, essas ações poderiam ser iniciadas depois. Para ele, a decisão não deve interessar boa parte das grandes empresas que tomaram créditos nesse período. A discussão seria mais relevante para as que estão no início da cadeia produtiva, como os distribuidores de medicamentos, por exemplo, que não tomam créditos, ou para as empresas menores, que estão no lucro presumido.
Alessandro Mendes Cardoso, do Rolim, Viotti & Leite Campos, diz que a decisão do STF desperta atenção, porque pode trazer repercussão para a Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) 18, que discute a exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e da Cofins. A exclusão do imposto estadual da base de cálculo representará uma economia significativa para as companhias. A União estima a disputa em R$ 89,4 bilhões, apenas entre os anos de 2003 e 2008.
Na visão de Fabio Silveira, da RC Consultores, o alívio não servirá para mudar o volume estimado de importações neste ano. Contudo, a redução da taxação aos importados traz uma influência de baixa nos preços para o mercado doméstico e barateia a cadeia de produção interna. Silveira ressalta que a diminuição de até 3% nos preços vale para as mercadorias no atacado. Na ponta final da cadeia, o consumidor não deve sentir tal redução. "Esse ganho vai se diluindo ao longo tanto da cadeia de produção quanto da de comercialização."
Pelo menos para o setor de máquinas e equipamentos, os preços vão cair. De acordo com a Abimei, associação que representa os importadores desse tipo de produtos, a redução deverá chegar a 3%. Ennio Crispino, presidente da associação, não crê que isso deva alterar significativamente o mercado, assim como a indústria nacional não deixará de vender menos.
"Só o crédito já tira esse benefício", diz Crispino. "O importado tem que ir ao mercado para financiar o equipamento, pagando entre 15% e 20% ao ano de juros. O nacional se financia através do Finame, do BNDES, que tem juros menores do que 3% ao ano." A tendência, contudo, afirma Crispino, é que a indústria nacional diminua sua margem para poder seguir competindo com o maquinário importado.
A indústria nacional vai acompanhar uma eventual redução dos importados, diz Paulo Fraccaro, diretor-executivo da Associação Brasileira da Indústria de Artigos e Equipamentos Médicos, Odontológicos, Hospitalares e de Laboratórios (Abimo). Ele ressalta, contudo, que a mudança na legislação acontece em momento inoportuno para seu setor, que vem tendo problemas com o importado. "Eles estão ficando mais competitivos em uma época em que o nacional não está ganhando nada." (Colaborou Leandra Peres, de Brasília)