A crescente criminalidade e a sensação de insegurança têm elevado a contratação de segurança privada clandestina. Muitas vezes um grupo de moradores se reúne e contrata informalmente um vigia de rua que recebe um valor mensal, rateado por todos os contratantes. A estimativa do Sindicato das Empresas de Segurança e Vigilância (SINDESP-MG) é de que já são 60 mil profissionais irregulares em Minas. Em contrapartida, os profissionais habilitados são cerca de 30 mil.
Mas qual é a natureza jurídica desse trabalho? Ao analisar o caso de um vigia de rua, a 6ª Turma de TRT-MG entendeu que a relação é típica de emprego, nos moldes do artigo 3º da CLT. Nesse contexto, decidiu confirmar, por unanimidade, a sentença que reconheceu o vínculo entre o trabalhador e um condomínio informal, condenando uma das tomadoras dos serviços ao cumprimento de obrigações próprias da relação de emprego.
No caso, o reclamante ajuizou a ação apenas em face de uma loja situada na área que ele vigiava. Para o relator, desembargador Jorge Berg de Mendonça, isso não é problema, pois cabe à parte autora eleger contra quem vai demandar em juízo."Nada impede que o autor busque receber seus direitos apenas em face de quem ele considere seu verdadeiro empregador direto", destacou. Analisando as provas do processo, ele constatou que o vigia trabalhava pessoalmente para a loja e para mais alguns vizinhos, recebendo pagamento de todos. O trabalhador, inclusive, tinha acesso parcial ao estabelecimento da ré, não acreditando o relator que não se sujeitasse às ordens dela.
Em seu voto, o magistrado lembrou que o trabalho subordinado é a característica principal da relação de emprego. Ele se verifica quando prestado em favor de alguém que paga o salário combinado e dispõe da força de trabalho contratada ou a utiliza em seu empreendimento, cujos riscos assume. Nessa linha de raciocínio, considera-se empregador quem contrata e remunera diretamente um vigia noturno, para proteção de seu patrimônio. Se a vigilância é feita a partir de postos situados nas imediações e o trabalho é prestado para outros vizinhos, isso pouco importa, no entendimento do julgador. "Os pressupostos da relação de emprego, no caso, estão estabelecidos, diretamente com o empreendimento em proveito do qual a vigilância foi feita", registrou na decisão.
A relação de emprego entre as partes ficou evidente. Seja por presunção, advinda do fato de a loja ter reconhecido a prestação de serviços durante certo tempo, sem prova de qualquer autonomia. Seja pela prova, que revelou que a prestação de serviços se revestia dos pressupostos exigidos para tanto (artigo 3º da CLT). O relator não teve dúvidas de que o vigia trabalhava pessoalmente e se subordinava às ordens dos tomadores, inclusive quanto ao cumprimento de horários. Conforme ressaltou, o caráter empregatício se deu em relação à reclamada e aos demais tomadores. A subordinação mais tênue foi considerada normal, diante da peculiaridade da função. "Ora, não era de se esperar que a ré precisasse permanecer no local emitindo ordens para o autor, pois a função é simples e, do contrário, a presença da contratante tornaria desnecessária a proteção patrimonial a que o autor se destinava", ponderou.
A existência de um condomínio informal foi reconhecida no caso, aplicando-se, por analogia, a Lei 2.757 de 23 de abril de 1956, a qual excluiu do trabalho doméstico os porteiros, zeladores, faxineiros e serventes de prédios de apartamentos residenciais, desde que a serviço da administração do edifício e não de cada condômino em particular. Portanto, o vigia não foi considerado doméstico.
Por fim, o relator considerou correta a solução encontrada na sentença, que fixou a parcela de responsabilidade da ré em 15% do montante calculado sobre os salários. Aplicando o artigo 1.317 do CPC, ele reconheceu que a reclamada se obrigou ao pagamento apenas da parte dela nas obrigações da relação de emprego."Do contrário, o autor poderia demandar contrato de todos os que o contrataram e receberia o equivalente a "n" salários por uma só e mesma jornada de trabalho, ou pela vigilância de um só conjunto, o que atenta contra a razão", refletiu. O reclamante conseguiu obter ainda a condenação da loja ao pagamento de adicional noturno e reflexos.